domingo, 10 de outubro de 2010

Madres do Deserto - A Herança de Rebeca


Hoje, damos continuidade ao nosso estudo juntamente com as santas mulheres do Antigo Testamento, ao melhor, estamos a escutar aquilo que elas têm a nos dizer e a nos ensinar no concreto de nossa vida, mesmo com o passar dos anos.

A Herança de Rebeca

Talvez vocês se surpreendam ao ouvir que a herança mais valiosa que pretendo deixar-lhes seja minha familiaridade com o Senhor, meu costume de recorrer a Ele inclusive naquele momento crítico de minha vida em que fiquei grávida e os gêmeos que trazia em meu ventre se agitavam violentamente dentro de mim. Mas acorri àquele que chamavam El-Shaddai, cheia de confiança e segura de que ia prestar-me atenção e dar-me uma resposta. E meu legado para vocês é procurar uma convivência com o Senhor sem nunca perder o contato com Ele. Façam da busca constante da sua face e de sua Palavra sua atividade mais freqüente e cotidiana, para que essa referência contínua e essa sintonia com Ele se tornem conatural, de tal modo que sejam os critérios e preferências dele que configurem suas mentalidades.
Não se esqueçam de recorrer a Ele para consulta naqueles momentos de suas vidas nos quais ficam perplexas ou desoladas, mas estejam também abertas a que seus pensamentos e seus caminhos não incidam com os de vocês. Recordo muito bem o que me contou Eleazar, o servo que Abraão enviou para buscar uma esposa para Isaac: enquanto eu tirava a água do poço para dar de beber aos seus camelos, ele me observava em silêncio, atento ao sinal que o Senhor lhe daria sobre a mulher eleita, se era eu ou não (Gn 24,21).
É a essa atitude vital que as convido: viver despertas e atentas, contemplando silenciosamente a realidade para encontrar nela os sinais de Deus e sintonizar com ele e o sinal que recebi do Senhor quando o consultei foi esta palavra ouvida no fundo do meu coração: Há duas nações em teu seio, dois povos saídos de ti se separarão, um povo dominará um povo, o mais velho servirá ao mais novo (Gn 25, 22-23). Aquela revelação me deixou desconcertada: que Deus era aquele que punha o mais novo acima do mais velho e o importante sob o insignificante? Decidi acolher àquela estranha eleição, por isso, meu coração se inclinou para Jacó, o que nasceu por último, agarrado ao calcanhar de seu irmão, enquanto que Isaac preferia Esaú. Dei-me conta de que concordar com El-Shaddai era mais importante do que seguir os critérios do meu clã, os mesmos de todos os povos que nos rodeavam. Por isso, teci a trama que levou Jacó a apoderar-se da bênção reservada ao primogênito: foi minha maneira de concordar com as preferências de Deus, ainda que consciente dos perigos que isso implicava. Sempre fui uma mulher decidida e lutadora, a quem não assustavam os conflitos a fim de conseguir o que queria, e não me deixei encerrar nos estereótipos e “lugares determinados” que pretendiam me dar por ser mulher. Ao longo da história os que falaram sobre mim consideraram sempre o espírito de serviço exemplar com que dei de beber aos dez camelos de Eleazar.
Em compensação não costumam ressaltar o risco das minhas decisões: quando meu filho Jacó resistia a apresentar-se diante de Isaac simulando ser Esaú, disse-lhe: Cai sobre mim tua maldição, meu filho. Obedece-me e faz o que te digo (Gn 27,13).
Quisera transmitir-lhes algo dessa minha capacidade de decisão, juntamente com a valentia de correr riscos a fim de que vocês se sintonizem com as preferências de Deus e inclinem o coração e a vida, cada vez mais espontaneamente, aos que são a menina dos olhos de Deus e não aos que têm todos os poderes. Deixo-lhes também algo de minha arte de tecer tramas e pequenas redes pelas quais podem ter acesso à bênção aqueles que parecem dela excluídos.
Vocês vivem em tempos de redes (ah! As que eu criaria se tivesse vivido no terceiro milênio!) e como podem tornar-se peritas nessa arte e empregar toda a sua criatividade e energia em criá-las, apoiando-se umas nas outras. E se a sua atenção estiver dirigida para fora de vocês própria, ficarão libertas do ensinamento competitivo e asséptico que tanto ameaça a teologia.
Talvez lhes pareçam ações insignificantes que, como reconhece Eduardo Galeano, “não acabam com a pobreza, não suprimem o subdesenvolvimento, não socializam os meios de produção nem desapropriam as cavernas de Ali Babá. Todavia, talvez desencadeiem a alegria de agir e a traduzam em atos. E por fim, atuar sobre a realidade e transformá-la, ainda que seja um pouquinho, é a única maneira de provar que a realidade é transformável”.

Madre Rosa Maria de Lima, F.M.D.J

Um comentário:

  1. De onde foram retiradas as informações acima sobre Rebeca?
    Não vejo a hora de conhecer a história de Raquel!

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