quarta-feira, 2 de novembro de 2011

Escada do Paraíso – São João Clímaco (Parte I)




SÃO JOÃO CLÍMACO (580-650)


"Entre todas as ofertas que podemos fazer a Deus, a mais agradável a Seus olhos é indiscutivelmente a santificação da alma por meio da penitência e da caridade".


Filhos amados de Maria, caríssimos irmãos em Cristo Jesus,

O Monte Sinai está historicamente ligado ao cristianismo. Foi o lugar indicado por Deus para entregar a Moisés as tábuas gravadas com os Dez Mandamentos. Assim, já no século IV, depois das perseguições romanas, vários mosteiros rudimentares foram ali construídos por numerosos monges que se entregavam à vida de oração e contemplação. Esses mosteiros tornaram-se famosos pela hospitalidade para com os peregrinos e pelas bibliotecas que continham manuscritos preciosos. Foi neste ambiente que viveu e atuou o maior dos monges do Monte Sinai, João Clímaco.

São João Clímaco nasceu em 580. De grande inteligência, formação literária e religiosa, ainda muito jovem, aos dezesseis anos, optou pelo deserto e viajou para o Monte Sinai, tornando-se discípulo num dos mais renomados mosteiros. Isso aconteceu depois de renunciar à fortuna da família e a uma posição social promissora. Preferiu um cotidiano feito de oração, jejum continuado, trabalho duro e estudos profundos. Só descia ao vale para recolher frutas e raízes para sua parca refeição e só se reunia aos demais monges nos fins de semana, para um culto coletivo.

O nome de São João Clímaco, Clímaco deve o seu cognome a um livro seu é uma alusão à palavra "klímax', que em grego significa escada. São João decidiu adotar este nome em virtude do livro escrito por ele mesmo, intitulado Escada para o Paraíso. A Escada é um resumo da vida espiritual, concebida para os solitários e contemplativos. Para Clímaco, a oração é a mais alta expressão da vida solitária; ela se desenvolve pela eliminação das imagens e dos pensamentos. Daí a necessidade da 'monologia', isto é, a invocação curta, de uma só palavra, incansavelmente repetida, que paralisa a dispersão do espírito. Essa repetição deve assimilar-se com a respiração.

Nesta obra ele explica que existem 30 degraus a serem galgados para que possamos atingir a perfeição moral. Este livro foi um grande sucesso na época e chegou até mesmo a influenciar monges e outros religiosos com sua conduta particular, tanto no Ocidente como no Oriente. A importância desta obra literária para a época pode ser notada na utilização do símbolo escada na arte bizantina.

São João Clímaco foi muito famoso como homem santo em toda a Palestina e Arábia. Conta-se que ele era palestino e na adolescência ingressou cm um mosteiro no Monte Sinai, onde passou a dedicar sua vida às orações e à meditação. Até os 35 anos, viveu desta forma, mas quando seu mestre faleceu resolveu encerrar-se cm uma cela e viver à moda dos monges do deserto: jejuando, orando e estudando a Bíblia.

Sua fama se espalhou e muitos peregrinos iam procurá-lo para aprender com seus ensinamentos e conselhos. Inicialmente eram apenas os que desejavam seguir a vida monástica, depois eram os fiéis que queriam uma direção espiritual e uma benção do monge, já tido em vida como santo.

O seu retiro eremítico desabrochou num amor ardente pelo próximo e a Deus. Certo dia, seu discípulo, Moisés, adormeceu debaixo de uma enorme pedra. João, orando em sua cela, viu que seu discípulo estava em perigo e orou a Deus por ele. Quando Moisés retornou mais tarde, se ajoelhou e agradeceu por ter lhe salvado da morte certa. Ele lhe contou como, em sonho, ouviu João lhe chamando e rapidamente se levantou. Naquele momento a pedra caiu. Se ele não tivesse se levantado, a pedra teria lhe esmagado.

Durante este novo período de sua vida São João Clímaco decidiu nunca mais comer carne, fosse ela vermelha ou branca. Também passou a sair de sua cela apenas para participar da Eucaristia, aos domingos.

Depois de quarenta anos de vida eremítica vivida no amor a Deus e ao próximo, anos durante os quais chorou, rezou, lutou contra os demônios. Já com 70 (sessenta) anos foi eleito por unanimidade abade geral de todos os eremitas da serra do Monte Sinai, muito embora preferisse continuar com sua vida isolada, e assim voltou à vida em comunidade no mosteiro. Nesta época construiu hospitais para a população mais pobre, ajudado pelo papa Gregório Magno.

Mas os últimos quatro anos de sua vida, nostálgico da vida eremítica, passou ao irmão monge no mesmo mosteiro, a guia da comunidade. Neste período de total isolamento ele escreveu muito e o que dele se conserva até hoje é um livro importantíssimo que teve ampla divulgação na Idade Média, "Escada do Paraíso", livro que lhe trouxe também o sobrenome Clímaco que, em grego, significa "aquele da escada". No seu livro ele estabeleceu trinta degraus necessários à subir para alcançar a perfeição da alma.

Trata-se de um verdadeiro manual, a síntese da doutrina monástica e ascética, para os noviços e monges, e para todo o cristão, onde descreveu, degrau por degrau, todas as dificuldades a ser vivida, a superação da razão e dos sentidos, e que as alegrias do Paraíso perfeito serão colhidas no final dessa escalada, após o trânsito para a eternidade de Nosso Senhor Jesus Cristo.

João Clímaco morreu no dia 30 de março de 649, amado e venerado por todos os cristãos do mundo oriental e ocidental, sendo celebrado por todos eles no mesmo dia do seu falecimento.


DEGRAUS PARA ALCANÇAR A VERDADEIRA VIDA


«A Escada para o Paraíso com seus 30 degraus, uma obra que influenciou a conduta de vários religiosos, tanto no Ocidente quanto no Oriente.»

Em seu livro, João descreve o caminho do monge, desde a renúncia ao mundo até a perfeição do amor. É um caminho que se desenvolve através de trinta degraus, cada um dos quais está ligado ao seguinte. O caminho pode ser resumido em três fases sucessivas: a primeira se expressa na ruptura com o mundo, em vista de voltar ao estado da infância evangélica. Portanto, o essencial não é a ruptura, mas a ligação com aquilo que Jesus disse, ou seja, o regressar à verdadeira infância em sentido espiritual, o tornar-se como as crianças.

João comenta: "Um bom fundamento é formado por três bases e por três colunas: inocência, jejum e castidade". O desapego voluntário das pessoas e dos lugares queridos permite à alma entrar em comunhão mais profunda com Deus. Esta renúncia leva à obediência, que é o caminho para a humildade diante das humilhações que nunca faltarão por parte dos irmãos.

A segunda fase do caminho é constituída pelo combate espiritual contra as paixões. Cada degrau da escada está ligado a uma paixão principal, que é definida e diagnosticada, com a indicação da terapia e com a proposta da virtude correspondente.

A luta contra as paixões reveste-se de positividade, não permanece algo negativo graças à imagem do "fogo" do Espírito Santo: "Todos aqueles que empreendem este bom combate, duro e árduo saibam que vieram lançar-se num fogo, se verdadeiramente desejam que o fogo imaterial habite neles". O fogo do Espírito Santo, que é fogo do amor e da verdade. Só a força do Espírito Santo assegura a vitória.

A última fase do caminho é a perfeição cristã, que se desenvolve nos últimos sete degraus da Escada. Estes são os degraus mais altos da vida espiritual. Dos primeiros três: simplicidade, humildade e discernimento, João, considera mais importante o último, ou seja, a capacidade de discernir.

Cada comportamento deve ser submetido ao discernimento. Aqui entra-se no núcleo vivo da pessoa e trata-se de despertar no eremita, no cristão, a sensibilidade espiritual e o "sentido do coração", dons de Deus: "Como guia e regra em cada coisa, depois de Deus, temos que seguir a nossa consciência". Deste modo alcança-se o estado de tranquilidade da alma, de paz interior, que prepara para a oração, que em João é dúplice: a "oração corpórea" e a "oração do coração".

A primeira é própria de quem se deve fazer ajudar por atitudes do corpo: estender as mãos, bater ao peito, etc.; a segunda é espontânea, porque é efeito do despertar da sensibilidade espiritual, dom de Deus a quem se dedica à oração corpórea.

Em João ela adquire o nome de "oração de Jesus" e é constituída pela invocação exclusiva do nome de Jesus, uma invocação contínua como a respiração: "A memória de Jesus seja uma só com a tua respiração, e então conhecerás a utilidade da paz interior". No final, a oração torna-se muito direta, simplesmente a palavra "Jesus", que se faz uma só com a nossa respiração.

O último degrau da escada é dedicado à suprema "trindade das virtudes": a fé, a esperança e, sobretudo, a caridade. Da caridade, João fala também como amor humano. João está convencido de que uma intensa experiência deste amor faz progredir a alma muito mais que a dura luta contra as paixões, porque o seu poder é grande. Todavia, a caridade é vista também em estreita relação com a esperança. A força da caridade é a esperança.

A esperança nos torna capaz de viver a caridade, de suportarmos os cansaços e as decepções de todos os dias, de sermos bons para com os outros, sem esperar uma recompensa.


OS TRINTA DEGRAUS DA ESCADA DE SÃO JOÃO CLIMACO:


1º degrau: a renúncia à vida do mundo;

2º degrau: renúncia aos afetos terrenos;

3º degrau: fuga do mundo;

4º degrau: bem-aventurada e sempre louvável obediência;

5º degrau: verdadeira e sincera penitência;

6º degrau: pensamento da morte e dom de lágrimas;

7º degrau: a tristeza que produz alegria;

8º degrau: a doçura que triunfa a cólera;

9º degrau: esquecimento das injúrias;

10º degrau: fugir da maledicência, que seca a virtude da caridade;

11º degrau: amor ao silêncio, porque falar muito leva à vanglória;

12º degrau: fugir da mentira, que é ato de hipocrisia;

13º degrau: combater o enfado e a preguiça, uma vez que esta última destrói por si só todas as virtudes;

14º degrau: praticar a temperança, porque comer guloseimas é hipocrisia do estômago;

15º degrau: amor à castidade;

16º degrau: viver a pobreza, oposta à avareza;

17º degrau: não deixar o coração endurecer (isso causa a morte da alma);

18º degrau: sono e do canto público dos salmos;

19º degrau: fazer vigílias;

20º degrau: timidez pueril;

21º degrau: não praticar a vanglória;

22º degrau: fugir do orgulho;

23º degrau: fugir da blasfêmia;

24º degrau: doçura da alma, simplicidade;

25º degrau: humildade;

26º degrau: discernimento nos pensamentos;

27º degrau: vida interior e paz de alma;

28º degrau: oração, que é santa e fecunda fonte de virtudes;

29º degrau: recolhimento do espírito e repouso do corpo que lhe são necessários;

30º degrau: fé, esperança e caridade


PENSAMENTOS DE SÃO JOÃO CLÍMACO:


"O verdadeiro monge: o olhar da alma, imóvel; o sentido corporal, inabalável... uma luz que não se apaga aos olhos do coração".


"Aqueles cujo espírito aprendeu a orar, na verdade falam ao Senhor face a face, como os que falam ao ouvido do imperador; aqueles cuja boca ora, fazem lembrar os que se prostram diante do imperador, na presença de toda corte. Os que vivem no mundo são os que dirigem sua súplica ao imperador, na balbúrdia de todo povo".


"Que vossa oração ignore toda multiplicidade: uma única palavra bastou ao Publicano e ao filho pródigo para obter o perdão".


"O grande herói da sublime e perfeita oração diz: 'prefiro dizer cinco palavras com a minha inteligência... (1Cor14,19). As crianças pequenas não tem ideia disso: imperfeito como somos, com a qualidade também nos é necessária a quantidade. A segunda consegue para nós a primeira...".


"A solidão do corpo é a ciência e a paz da conduta e dos sentidos; a solidão da alma, a ciência dos pensamentos e um espírito inviolável. O amigo da solidão é um espírito de sentinela, valente e inflexível, sem sono, à porta do coração, para derrubar e matar os que se aproximam".


"O monge tem necessidade de grande vigilância e de um espírito isento de agitação. O cenobita tem frequentemente o apoio de um irmão; o monge, o de um anjo".


"Fechai a porta da cela a vosso corpo, a porta dos lábios às palavras, a porta interior aos sentidos".


"A obra da solidão (hesychia) é uma despreocupação total por todas as coisas razoáveis ou não".


"Basta um fio de cabelo para embaralhar a vista; basta uma simples preocupação para dissipar a solidão (hesychia), pois a solidão é despojamento dos pensamentos e renúncia às preocupações razoáveis".


"Quem possui verdadeiramente a paz, não se preocupa mais com o próprio corpo".


"Quem quer apresentar a Deus um espírito purificado, e se deixa perturbar pelas preocupações, assemelha-se a alguém que tivesse entravado fortemente as pernas e pretendesse correr".


"É grande a utilidade da leitura para esclarecer e recolher o espírito".


"Procurai vossas luzes sobre a ciência da santidade, mais nos trabalhos do que nos livros".


"Quem se sente diante de Deus, do fundo do coração, será como uma coluna imóvel durante a oração".


"O monge que vela é um pescador de pensamentos; sabe distingui-los sem dificuldade, na calma da noite, e apanha-los".


"Nada de rebuscamento nas palavras de vossa oração: quantas vezes os balbucios simples e monótonos das crianças fazem o pai ceder!".


"Não vos entregueis a longos discursos, para que vosso espírito não se dissipe na procura das palavras. Uma única palavra do Publicano comoveu a misericórdia de Deus; uma única palavra cheia de fé salvou o Ladrão".


"A prolixidade na oração frequentemente enche o espírito de imagens e o dissipa, enquanto muitas vezes o efeito de uma única palavra (monologia) é recolhê-lo".


"Senti-vos consolados e enternecidos por uma palavra da oração? Parai nessa palavra; isso quer dizer que o nosso anjo da guarda então ora conosco".


"Nada de segurança demais, mesmo tento conseguido a pureza; mas, sim, uma grande humildade, e sentireis então maior confiança".


"Quando vos tiverdes revestido da doçura da ausência de ira, não vos será mais muito custoso libertar vosso espírito do cativeiro".


"Trabalhai para elevar o vosso pensamento, ou melhor, para recolhê-lo nas palavras de vossa oração; se a fraqueza o faz cair, levantai-o".


"O primeiro degrau da oração consiste em expulsar, por meio de um pensamento (ou uma palavra) simples e fixo (monologicamente), as sugestões, no momento mesmo em que se manifestam. O segundo, em conservar nosso pensamento unicamente no que dizemos e pensamos".


"Ressuscitados do amor pelo mundo e pelos prazeres, afastai as preocupações, despojai-vos dos pensamentos, renunciai ao corpo, uma vez que a oração nada mais é que um exílio do mundo visível e invisível".


"Não se aprende a ver; é um efeito da natureza. A beleza da oração também não se aprende através do ensinamento. Ela tem em si própria o seu mestre; Deus 'que ensina ao homem o saber' (Sl 94,10) dá a oração e abençoa os anos dos justos".


"Bem aventurado o que apresenta por Deus um desejo tão grande como de um louco enamorado"


SÃO JOÃO CLÍMACO, ROGAI POR NÓS!

Fontes:

Revista Santo do Dia, Ed. Casa Dois, S. Paulo, 2001.

São João Clímaco, "A Escada da Ascensão Divina" (Boston: Holy Transfiguration Monastery, 1978



Escada do Paraíso- Parte I

Durante as próximas quartas feiras, irei publicar pequenos trechos do livro Escada do Paraiso.

5 comentários:

  1. JHS
    A Paz de Jesus!

    Gostaria muito de adquirir este livro, tenho pesquisado inutimente, pois não acho para comprar.
    Se for possível me indique onde posso comprar, me ajudará muito em minha formação!
    Muito obrigado! emersovocacionado@hotmail.com

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    Respostas
    1. se achar me manda
      mateuspavine@hotmail.com

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    2. Veja edição online em português:
      http://www.mediafire.com/view/?vx3p0rzs18we4f7

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    3. Eis aí o livro em pdf, gatuito.
      http://alexandriacatolica.blogspot.com.br/2013/02/escrito-originalmente-em-grego-por-sao.html

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  2. A paz de Jesus ,cliquei no link acima e não consegui fazer download do livro. Estou tentando obter o livro e não consigo.Gostaria de obter informações. Muito grata.

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