terça-feira, 19 de outubro de 2010

Um olhar para a eternidade - Parte I


Queridos irmãos, a paz! Iniciamos hoje o estudo sobre uma realidade que sempre tocou muito de perto o coração dos católicos: o purgatório. Como o estudo é longo, será postado por partes. O autor é o Pe. Livio Fanzaga, um entusiasta das aparições da Rainha da Paz e diretor da Rádio Maria, uma rádio católica italiana.

Um olhar para a eternidade
Parte I

Uma realidade complexa
Já falamos sobre as duas realidades que permanecerão para sempre: o inferno ou a condenação eterna e o paraíso ou a felicidade eterna. Este será o fim definitivo do drama da vida e da liberdade humana. Mas não esgotamos o nosso estudo sobre a vida após a morte: devemos ainda falar sobre o purgatório, uma realidade escatológica, que dura somente até o fim do mundo e o juízo final. Depois disso, haverá somente a alegria eterna ou o ódio eterno como os possíveis resultados das escolhas feitas pela nossa liberdade.


A reflexão sobre o purgatório se reveste de um grande valor, propondo problemas objetivamente interessantes de se resolver: a sua existência, as raízes bíblicas desta doutrina, a tomada de consciência e o aprofundamento desta verdade por parte da Igreja, sobretudo na esteira da piedade dos fiéis, e ainda a própria natureza das dores do purgatório.


O mais importante desses problemas, talvez o que nos toca mais de perto, é o da relação que pode existir e que ocorre entre as almas do purgatório e nós. Mas, além desses problemas, o purgatório nos toca muito porque a própria palavra purgatório (de purgar, purificação) nos evoca muito de perto o caminho da santidade, isto é, o caminho da nossa purificação pessoal. Pode-se dizer que existe uma estreita ligação entre a intensidade do nosso caminho de santidade e a efetiva possibilidade do purgatório para cada um de nós.


Comparação entre a doutrina católica e a doutrina protestante sobre o tema do purgatório
Procuremos primeiro entrar na questão do purgatório que, embora estando apenas acenada na Bíblia, é uma realidade muito viva na consciência dos fiéis. E quando falo de fiéis, falo primeiro dos fiéis de fé católica, os quais, sobre este ponto, têm apresentado uma notável continuidade ao longo dos séculos. O mesmo se pode dizer também da Igreja Ortodoxa, apesar de hoje existirem alguns teólogos ortodoxos que colocam em dúvida a existência ou a natureza do purgatório. No entanto, de modo geral, a Igreja Ortodoxa concorda com a Igreja Católica em indicar a sua existência e em definir o seu objetivo, que é o de completar a purificação ainda não realizada nesta vida.


No entanto, uma negação consistente, radical, cada vez mais decidida do purgatório veio da igreja protestante, a partir de Lutero. Sem dúvida, nesta negação do purgatório pelos protestantes entram em jogo alguns princípios fundamentais da reforma protestante, e em primeiro lugar a primazia da Bíblia: como sabemos, não está incluído no cânone protestante o Livro dos Macabeus, que é o livro que fala explicitamente do purgatório.


A própria existência do purgatório contradiz a concepção luterana da justificação do pecador. De fato, de acordo com Lutero, o homem, embora com a ajuda da graça, não pode alcançar o estado de justiça, que é uma purificação e uma nova criação interior: o estado de justificação (isto é, o estado de santidade) nos é imputado a partir do exterior, de Deus. A justificação para Lutero é um revestimento externo por parte de Cristo, não é um processo de espiritualização e de santificação interior: uma vez que Cristo perdoou o pecador e lhe imputou a sua justiça, isto é, aquela justiça que Cristo conquistou para nós na cruz, o pecador é santo aos olhos de Deus, mesmo se for, ao mesmo tempo, um pecador em seu coração, isto é, mesmo que, ao mesmo tempo, ainda tenha em si as raízes do pecado. Segundo Lutero, não há necessidade do purgatório se, no momento da morte, o Pai vê o pecador em Cristo, revestido da justiça de Cristo.


Entretanto, de acordo com o conceito de justificação elaborado pelo Concílio de Trento (ecumênico XIX, 1545-1563), conceito que sempre foi um dado fundamental da Igreja, o processo de justificação se identifica de alguma forma com o processo de purificação do coração. O coração se liberta primeiro do pecado mortal e depois dos pecados veniais, em seguida, das raízes do mal, que são chamadas pelos teólogos com o termo “concupiscência”, o que significa o impulso ao mal e ao egoísmo que permanece em nós, mesmo após o batismo.


O processo de purificação e de justificação, de acordo com o ponto-de-vista católico, é um processo de restauração interior: trata-se verdadeiramente de fazer morrer o homem velho e de fazer crescer em nós o homem novo, o homem no Espírito Santo, o homem que não vive mais segundo a carne, mas segundo o espírito. O ponto culminante do processo de justificação é a capacidade de amar a Deus sobre todas as coisas. Segundo a teologia católica, aquele que, durante a vida terrena, não concluir este processo de purificação e restauração, por assim dizer, da imagem de Deus em seu coração, chegando ao momento da morte com uma fraca capacidade de amar, precisa completar o processo de purificação exatamente por ser chamado a amar a Deus na visão beatífica com um ato de amor perfeito.


Portanto, o que divide os católicos dos protestantes, em relação à existência do purgatório, não é somente o fato de que a Igreja, levando em conta os dados bíblicos, privilegie aquela que foi desde as suas origens a tradição do culto dos mortos e da oração pelos mortos: o centro da discórdia é justamente o próprio conceito de purificação. Segundo os protestantes, não existe uma purificação como processo interior, mas há uma imputação da justiça de Cristo ao pecador pela qual ele, mantendo-se um pecador com o seu impulso para o mal, é apesar disso perdoado por Deus e, portanto, acolhido no paraíso imediatamente após a morte, se esta justiça lhe é imputada pelo Pai em Cristo. Entretanto, para a Igreja Católica esta justiça deve traduzir-se em uma reconstituição da imagem de Deus no coração humano.

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