sexta-feira, 16 de maio de 2014

A LECTIO DIVINA, À LUZ DO ENSINAMENTO DOS PADRES DO DESERTO - LITURGIA DIÁRIA , 16 DE MAIO DE 2014

 
A LECTIO DIVINA, À LUZ DO ENSINAMENTO DOS PADRES DO DESERTO

Gostaria, agora, de trazer algumas reflexões sobre a concepção que hoje se tem da lectio divina, à luz do ensinamento dos Padres do Deserto. O que hoje é chamado lectio divina é apresentado como um método de leitura da Escritura e também da leitura dos Padres da Igreja e dos Padres do monaquismo. Consiste numa leitura lenta e meditativa do texto, uma leitura feita mais com o coração do que com a mente, como se costuma dizer, sem um objetivo prático, mas simplesmente deixando-se ser impregnado com a Palavra de Deus. Este método, enquanto método, tem suas origens no século 12, e está relacionado como que tem sido chamado de "teologia monástica". Nesta época, os pré-escolásticos desenvolveram seu método que passava da"lectio" para a" quaestio" , e daí para a "disputatio". A reação dos monges foi, então, de desenvolver seu próprio método: lectio levando à meditatio, e daí à oratio ... e um pouco depois acrescentaram a "contemplatio" que foi então distinta da"oratio". Mesmo se a abordagem da Escritura que descrevi como sendo a dos Padres do Deserto fosse, em realidade, uma aborgaem que eles tinham em comum com o povo de Deus como um todo, a nova abordagem ou novo "método" - uma vez que agora era um exercício, uma observância importante da existência monástica - refugiou-se nos mosteiros. Muito depois, à época da devotio moderna, a "leitura espiritual" se tornou popular, e tomou-se cuidado de distingui-la claramente da lectio divina monástica. Seguindo uma tendência geral, a vida espiritual tornou-se especializada, ou dividida em compartimentos estanques. Seria estranho para o tema da presente conferência analisar esta longa evolução. Eu me permitirei, entretanto, tecer algumas observações. A primeira é a de que pode-se perguntar como a teologia teria se desenvolvido se os monges não tivessem rejeitado o método que estava nascendo. De fato, o que se tem chamado de "teologia monástica" não tinha nada de especificamente monástico até o século 12. Foi o modo pelo qual a teologia se desenvolveu entre o povo de Deus, seguramente com tanto pluralismo nos mosteiros quanto fora deles
 
Esta maneira discernida e contemplativa de expressar a teologia até então conhecia como levar em conta e transformar (hoje se diria, inculturar), as contribuições dos diversos métodos e das diversas correntes de pensamento. Poder-se-ia legitimamente cogitar como a teologia dos séculos subsequentes teria evoluído caso os monges não tivessem rejeitado o método nascente e tivessem sabido como assimilá-lo como assimilaram tantos outros anteriormente. De todo modo, quer tenha sido bom ou não, conservou-se um modo de fazer teologia denominado "monástico" nos mosteiros, enquanto a teologia escolástica se desenvolvia nas escolas fora dos mosteiros. Por um Tomás de Aquino, é verdade que tal novo método ainda era usado numa perspectiva profundamente contemplativa. Entre os comentadores - e os comentadores dos comentadores - tornou-se cada vez mais seco. Foi o mesmo com o estudo da Escritura. Até hoje, os monges desempenharam um papel predominante na interpretação e uso da Escritura, mesmo se sua abordagem não seja essencialmente diferente daquela do povo de Deus como um todo
 
Da época em que sob a influência do novo modo de pensar, os monges desenvolveram também seu próprio método de leitura, paralelo ao da escolástica, existem na Igreja duas abordagens da Escritura: uma que diz respeito à leitura com o coração (e que em certas épocas, irá deixar de trazer junto a inteligência) e uma de orientação científica, que se tornará cada vez mais seca. Por outro lado, deveríamos compreender que os monges, ao proporem seu próprio método de lectio , já estavam dependentes da nova mentalidade pré-escolástica que havia criado a necessidade de um método. Os primeiros monges não tinham método. Eles tinham uma atitude de leitura. Muitas vezes nos séculos passados os monges esqueceram sua maneira própria característica de leitura da Escritura e dos Padres e de fazer teologia, e adotaram a de todo mundo. Foi então necessário para os monges de hoje voltar ao modo de fazer teologia que não o dos livros escolásticos, e voltar a um modo de ler as Escrituas e os Padres que não o da exegese científica moderna. Temos uma dívida de gratidão a Dom Jean Leclercq por ter apontado ao monaquismo contemporâneo esta direção. Além disto, devemos dizer com um sorriso que os conceitos de teologia monástica e de lectio divina como entendemos estas duas realidades hoje em dia, são as duas mais belas criações de Dom Jean Leclercq. Repito que foi importante que o monaquismo redescobrisse esta maneira de ler a Escritura e seu modo de fazer teologia. Mas ele tem de ir adiante: reconhecer que esta maneira de leitura da Escritura e de fazer teologia não é em absoluto especificamente monástica. É todo o povo de Deus que deve redescobri-la, uma vez que esta é a maneira pela qual, numa época, todo o povo de Deus costumava ler a Escritura e fazer teologia
 
Devemos, entretanto, dar outro passo. Precisamos ir para além da separação da vida do monge da dos outros cristãos. Devemos redescobrir a unidade primitiva que foi perdida no caminho. De fato, se é verdade que deveríamos nos alegrar com o lugar que a lectio divina tem tido na vida dos monges e também na de muitos cristãos fora dos mosteiros nos últimos 40 anos ou quase, é também verdade que a atitude presente em relação a esta realidade não é sem perigo. E este perigo reside em que, com muita frequência, embora de modo algo imperceptível, a lectio é transformada num exercício - um exercício entre outros, mesmo se considerado o mais importante de todos. O monge fiel tira uma meia hora ou uma hora ou até mais de lectio todos os dias, e se move daí para a leitura espiritual, seus estudos e suas outras atividades. Ele adota uma atitude gratuita de escuta de Deus durante esta meia hora, e muitas vezes se dá a outras atividades durante o resto do dia com o mesmo frenesi, o mesmo espírito de competição, a mesma distração, como se não tivesse escolhido uma vida de oração contínua e de constante busca da presença de Deus. Nada é tão absolutamente estranho ao espírito dos monges do deserto que esta atitude, que é uma contradição da verdadeira natureza da lectio divina. O que é a essência da lectio, como descrito pelos seus mais importantes expoentes, é a atitude interior. Esta atitude, porém, não é algo que se possa assumir por meia hora ou uma hora por dia. Tem-se esta atitude ou todo o tempo ou nunca. Ela impregna todo o dia, ou o exercício da lectio não tem sentido. Permitir-se ser questionado por Deus, permitir-se ser desafiado, formado, através de todos os elementos do dia, através do trabalho assim como dos encontros fraternais, através da dura ascese de um trabalho intelectual sério assim como através da celebração da liturgia e das tensões normais da vida da comunidade - tudo isto é terrivelmente exigente
 
Relegar esta atitude de abertura total a um exercício privilegiado que se destina a impregnar por si o resto de nosso dia é talvez um modo muito fácil de fugir destas exigências. Para os Padres do Deserto, a leitura, a meditação, a oração, a análise, a interpretação, o exame, a tradução da Escritura - tudo isto formava um todo inseparável. Seria impensável para um Jerônimo considerar que sua análise elaborada do texto hebraico da Escritura para descobrir-lhe todas as suas nuances fosse uma atividade que não merecesse o nome de lectio divina. Certamente é bom que tenhamos redescoberto a importância da leitura da palavra de Deus com o coração, de lê-la de tal modo que permitamos que ela nos transforme. Mas penso que é um erro fazer um exercício dela ao invés de impregnar com esta atitude as mil e uma facetas de nossa abordagem da Escritura. Além do mais, crer que o texto da Escritura possa me encontrar em minha vida profunda, que ele possa me desafiar e me transformar só quando venho ante o texto nu, sem recurso a todos os instrumentos que poderiam me fazer encontrá-lo no seu primeiro sentido, faz correr o risco de conduzir-nos a uma atitude fundamentalista - aliás não rara em nossos dias - ou de novo, a um falso misticismo que também é bastante comum. Uma vez que se admite em geral em nossos dias que a lectio divina pode ter como seu objeto não só a Escritura, mas tambem os Padres da Igreja e, para os monges e monjas, em particular os Padres do monaquismo, permito-me uma reflexão também sobre isto. A tradição monástica, sendo uma interpretação viva da Palavra de Deus, tem uma importância semelhante a ela, embora secundária (Vemos, além disto, como os Padres do Deserto tenderam a dar o mesmo poder à Palavra ou ao exemplo de um Ancião transformado pelo Espírito como à Palavra de Deus ou um exemplo da Bíblia
 
Mas esta palavra vivida que está na tradição monástica também necessita ser continuamente interpretada e re-interpretada). Em nossos dias, os Padres têm sido redescobertos nas comunidades monásticas. E devemos louvar esta redescoberta. Mas sua mensagem, mesmo mais do que aquela das Escrituras, está enraizada numa dada cultura que não é, como se assume com muita frequência, a cultura monástica - como se houvesse uma só - mas mais o contexto cultural de tal época particular na qual os monges antigos viveram sua vocação monástica. O leitor moderno deve se expor a si mesmo (a) sem uma mente crítica que obstaculize a força transformante da graça com a qual viveram e se expressaram: mas ele/ela podem só dar este passo após terem "descascado" com uma sensibilidade crítica muito afinada a "casca" cultural sob a qual está escondido este precioso alimento. Assim como não existe uma cultura cristã, paralela a todas as culturas profanas, mas muitas culturas locais que foram cristianizadas - e em diferentes graus, do mesmo modo, não existe uma cultura monástica, mas muitas diferentes culturas transformadas pelo seu encontro com o carisma monástico. O uso dos Padres como assunto para a lectio divina requer um sério trabalho de exegese e de estudo para recapturar a realidade em que eles viveram para além da "casca" cultural. De outra forma, lê-se a si mesmo nos textos que se admira, e obviamente, acha-se mais a si mesmo do que admira-se a outrem. O monge de hoje será desafiado, chamado à conversão, transformado, pela leitura dos Padres do monaquismo, somente com a condição de que se permita ser tocado por eles em todos os aspectos de sua experiência monástica. E isto só irá acontecer na medida em que se une a eles no conjunto de sua experiência: o que pressupõe uma análise detalhada de sua linguagem e de sua maneira de falar, de seu pensamento, tanto filosófico, quanto teológico, do contexto cultural em que viveram. Parece-me artifical e mesmo perigoso distinguir este estudo da lectio propriamente dita, como se fora apenas um prelúdio... O monge de hoje necessariamente pertence a uma cultura definida e a uma Igreja local, e portanto a uma cultura cristã definida. Esta é a cultura que, nele, encontra a tradição monástica e deve ser desafiada e transformada por ela. Temo que, muitas vezes, em nossa abordagem dos Padres, brinquemos de vestir a cultura monástica do passado ao risco de transformar nossos mosteiros em campos de refugiados culturais
 
Conclusão : Os Padres do Deserto nos lembram da importância primordial da Escritura na vida do cristão e da necessidade de nos deixar ser constantemente transformados na Palavra de Deus que é o Cristo. Além disto, mesmo um estudo rápido como fizemos, da maneira em que eles abordaram a Escritura, por si mesmo nos faz trazer à baila certos aspectos da concepção moderna da lectio divina, ou mais precisamente, apela para que ir além deles para chegar a um entendimento mais profundo da unidade de sua experiência vivida. O monge, mais do que qualquer outro, não pode se permitir estar dividido. Seu próprio nome, monachos, o lembra sem cessar da unidade da preocupação, da aspiração e de atitude própria do homem ou mulher que escolheu viver um único amor com um coração indiviso
 
 

 



 

LITURGIA DO DIA 16 DE MAIO DE 2014


PRIMEIRA LEITURA (AT 13,26-33)

LEITURA DOS ATOS DOS APÓSTOLOS - Naqueles dias, tendo chegado a Antioquia da Pisídia, Paulo disse na sinagoga: 26“Irmãos, descendentes de Abraão, e todos vós que temeis a Deus, a nós foi enviada esta mensagem de salvação. 27Os habitantes de Jerusalém e seus chefes não reconheceram a Jesus e, ao condená-lo, cumpriram as profecias que se leem todos os sábados. 28Embora não encontrassem nenhum motivo para a sua condenação, pediram a Pilatos que fosse morto. 29Depois de realizarem tudo o que a Escritura diz a respeito de Jesus, eles o tiraram da cruz e o puseram num túmulo. 30Mas Deus o ressuscitou dos mortos 31e, durante muitos dias, ele foi visto por aqueles que o acompanharam desde a Galileia até Jerusalém. Agora eles são testemunhas de Jesus diante do povo. 32Por isso, nós vos anunciamos este Evangelho: a promessa que Deus fez aos antepassados, 33ele a cumpriu para nós, seus filhos, quando ressuscitou Jesus, como está escrito no salmo segundo: “Tu és o meu filho, eu hoje te gerei” - Palavra do Senhor
SALMO RESPONSORIAL (SL 2)

TU ÉS MEU FILHO, EU HOJE TE GEREI!

— “Fui eu mesmo que escolhi este meu Rei e em Sião, meu monte santo, o consagrei!” O decreto do Senhor promulgarei, foi assim que me falou o Senhor Deus: “Tu és meu Filho, e eu hoje te gerei!”

— Podes pedir-me, e em resposta eu te darei por tua herança os povos todos e as nações, e há de ser a terra inteira o teu domínio. Com cetro férreo haverás de dominá-los, e quebrá-los como um vaso de argila!

— E agora, poderosos, entendei; soberanos, aprendei esta lição: Com temor servi a Deus, rendei-lhe glória e prestai-lhe homenagem com respeito!
EVANGELHO (JO 14,1-6)

PROCLAMAÇÃO DO EVANGELHO DE JESUS CRISTO + SEGUNDO JOÃO - Naquele tempo, disse Jesus a seus discípulos: 1“Não se perturbe o vosso coração. Tendes fé em Deus, tende fé em mim também. 2Na casa de meu Pai, há muitas moradas. Se assim não fosse, eu vos teria dito. Vou preparar um lugar para vós, 3e quando eu tiver ido preparar-vos um lugar, voltarei e vos levarei comigo, a fim de que onde eu estiver estejais também vós. 4E para onde eu vou, vós conheceis o caminho”.5Tomé disse a Jesus: “Senhor, nós não sabemos para onde vais. Como podemos conhecer o caminho?” 6Jesus respondeu: “Eu sou o Caminho, a Verdade e a Vida. Ninguém vai ao Pai senão por mim” - Palavra da Salvação

 
MENSAGEM DE NOSSA SENHORA EM MEDJUGORJE - “Convido todos vocês a terem mais confiança em Mim e a viverem mais profundamente as Minhas mensagens. Eu estou com vocês e intercedo por vocês junto a Deus. Contudo, espero também que os seus corações se abram às Minhas mensagens. Alegrem-se porque Deus os ama e Ihes dá a cada dia a possibilidade de se converterem e crerem ainda mais em Deus Criador” – MENSAGEM DO DIA 25.05.94
 

São Simão StockA IGREJA CELEBRA HOJE , SÃO SIMÃO STOCK - O santo de hoje nasceu no condado de Kant (Inglaterra). Com apenas 12 anos, movido pelo Espírito Santo de Deus, abandonou sua família por uma vida eremítica, uma vida no deserto. Ele fez do tronco de uma árvore a sua morada, por isso o ‘Stock’ em seu nome (stock = tronco). Ali, se consagrou na penitência e na busca da salvação das almas. Descia até o povoado para visitar os doentes e evangelizar, e voltava para o seu retiro. Simão, homem de obediência ao Senhor. Deus o quis na família carmelita, recém chegados à Inglaterra. Após discernir, tornou-se um religioso nesta Ordem. Profundamente mariano, era um homem do serviço e dedicado aos irmãos. Nossa Senhora apareceu a ele, com o escapulário, apresentando-o como uma proteção especial àqueles que o usarem com devoção. Quanto mais marianos, mais cristãos! São Simão Stock, rogai por nós!

 

 

 

 

 

 

 
 

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